Resenha publicada na edição de 19/02/2011 do jornal “O Estado de São Paulo”
Como Rio Branco inventou o Brasil
19 de fevereiro de 2011 | 0h 00
MARCOS GUTERMAN – O Estado de S.Paulo
Em tempos de ufanismo revisitado, que a propaganda estatal reduz ao “orgulho de ser brasileiro” em relação ao resto do mundo, o livro recém-lançado O Dia em Que Adiaram o Carnaval (Unesp), do diplomata e historiador Luís Cláudio Villafañe Gomes Santos, revela-se um ensaio precioso, ao reconstituir a invenção da nacionalidade brasileira.
O título da obra diz respeito à curiosa ordem do governo republicano de adiar o carnaval em respeito à morte de José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, em 10 de fevereiro de 1912. Rio Branco tinha status de astro, porque lhe era atribuído o feito de ter desenhado as fronteiras do País – isto é, de ter dado um “corpo” à pátria que estava sendo criada.
Villafañe faz uma reflexão sobre o mito do Barão como construtor da nacionalidade e sua identificação com uma “certa ideia de Brasil” quase um século depois da independência. Trata-se de uma “paralisadora herança”, como comentou o embaixador Rubens Ricupero a propósito da persistente imagem de um país que atua no exterior tendo como lastro o genoma da “tolerância natural do brasileiro”, descrito por Stefan Zweig em Brasil, País do Futuro (1941).
O modo como o Brasil se enxerga no mundo, traduzido em sua política externa, é portanto o eixo em torno do qual Villafañe trabalha. A construção política dessa entidade, mostra o autor, começa como afirmação antilusitana e, ao mesmo tempo, como contraponto monárquico “ordeiro” ao “caos” republicano dos vizinhos latino-americanos. A “nação brasileira” que surge daí é formada por brancos europeus ricos. A escravidão criará o desconforto de uma imensa massa de pessoas que estão em toda parte, mas não integram a nação.
O sentido nacional só se completará no período republicano, mas a desigualdade social dificultou drasticamente a legitimidade do Estado. A “invenção” do Brasil, naquela oportunidade, dividia-se entre o passado português e a afirmação do mundo americano, sem lugar, contudo, para os brasileiros comuns.
Mesmo a república, porém, não ofereceu à massa, de imediato, um lugar na construção da identidade nacional brasileira. Foi preciso que houvesse a difusão das culturas ditas “subalternas”, contaminando a atmosfera da elite com o carnaval e o futebol como elos da nacionalidade. Foi necessário ainda criar “heróis” para representar o evangelho republicano – e Tiradentes foi o primeiro deles, embora tenha sido representante de um movimento que nem de longe era nacionalista; mas o alferes (ou a imagem que foi criada para ele) era alguém construído para simbolizar a união dos cidadãos, a participação popular e a luta autêntica pela independência.
A identidade internacional do Brasil, diz o autor, tem como referência fundamental, desde seu início como país independente, a América – entendida primeiramente como os EUA e depois como as repúblicas latino-americanas. O Brasil foi o único país americano que, em sua independência, não desenvolveu proximidade com a ideia de ruptura com o modo de vida europeu. Com a república, o antiamericanismo monárquico foi substituído pela defesa do “espírito americano”. É justamente com Rio Branco que a aliança com os EUA se consolida, sob a perspectiva de domínio geral estadunidense nas Américas e na hegemonia brasileira no nível sul-americano.
A partir de Getúlio Vargas, e desde então com esporádicos intervalos, a política externa brasileira se fundaria na dimensão do desenvolvimento econômico nacional em contraponto ao Hemisfério Norte, num apenas aparente afastamento do evangelho de Rio Branco. No início da Guerra Fria, o Brasil viu-se em condições de invocar o americanismo do Barão para cobrar tratamento preferencial dos EUA. A frustração com a resposta vaga de Washington a esse pleito – e também à promessa de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, feita pelo presidente Franklin Roosevelt a Vargas – empurrou o Brasil para uma aproximação maior com os demais países latino-americanos e para a ideia de que havia um bloco regional de subdesenvolvidos, entre os quais os brasileiros passaram a se incluir, que precisavam ser ouvidos.
Esse bloco se considerava moralmente superior às potências globais, porque seria vítima da corrida armamentista e das guerras imperialistas. Tal movimento rompeu a bipolaridade Leste-Oeste da Guerra Fria e estabeleceu a complexidade do debate Norte-Sul, com a defesa de um modelo de desenvolvimento fortemente estatal, em contraponto à doutrina democrático-liberal que se consideraria vitoriosa na queda do Muro de Berlim e que se fazia representar pelos EUA, justamente o “outro” na relação com a América Latina ao longo do século 20.
A identificação latino-americana, de tão importante para a nova etapa da ideia de nação brasileira, foi inscrita na Constituição de 1988. O discurso do Brasil hoje, sobre seu lugar no mundo, é fincado essencialmente na afirmação da liderança continental, ainda tendo como referência os EUA, numa inequívoca demonstração da resistência, mesmo controversa, da herança do Barão do Rio Branco – o nosso “Founding Father”.
Resenha publicada na revista Política Externa, Vol. 20 nº 1, jun/jul/ago 2011, págs. 217-221.
Por Boris Fausto (historiador e membro da Academia Brasileira de Ciências)
O dia em que adiaram o carnaval, título do livro do diplomata Luís Cláudio Villafañe G. Santos, sugere uma incursão no terreno da micro-história. Porém, ao mesmo tempo, o subtítulo nos remete a um tema muito mais amplo: o papel da política externa brasileira na construção da nacionalidade e do sentimento nacional.
O barão do Rio Branco insere-se nessa abordagem não apenas como ilustração de capa – uma fotografia de sua figura num vitral da Catedral Nacional de Washington –, mas por seu papel relevante na consolidação das fronteiras do Brasil e de uma linha diplomática que se iniciou a partir da Proclamação da República.
Faz todo sentido tomar a dimensão da política externa como elemento constitutivo da nacionalidade porque é nessa esfera que surge, nitidamente, a dimensão do “outro”, contraposta à dimensão do “nós”. Villafañe assinala também que, no plano das relações internacionais, é mais fácil concentrar-se nos pontos em que, na teoria, há um interesse comum a toda a comunidade e ocultar as contradições internas de cada sociedade. Além disso, a percepção, por um lado, de agravos históricos, perdas territoriais, espoliação, ou, por outro lado, de um destino manifesto ou de uma visão civilizadora são elementos que marcam fortemente os sentimentos nacionais (p. 184).
Tendo presente o foco central do livro, Villafañe busca precisar as noções com as quais lida; ao mesmo tempo, com idêntico objetivo, percorre o processo histórico brasileiro, dos tempos da Colônia aos dias de hoje. Ao elucidar noções, o autor toma-as como uma construção histórica, rejeitando assim, a tese de que os Estados e as nações seriam entidades naturais, decorrentes de uma cultura e de uma origem étnica e territorial comum.
Acrescentemos que a ideia de nação e o sentimento nacional variam ao longo do tempo. Mais ainda, a comunidade imaginária, na consagrada expressão de Benedict Anderson, que pressupõe homogeneidade e universalidade, encerra um problema porque tem uma dimensão social diferenciadora particularmente acentuada nos países marcados por uma forte desigualdade. Em poucas palavras, serão os mesmos os elementos e símbolos de que se compõe o sentimento de nacionalidade das elites, das massas trabalhadoras ou de outras camadas da população?
No caso brasileiro, considerando-se a baixa escolarização da maioria da população brasileira, parece certo que a escola – um dos grandes fatores para se inculcar a noção de nacionalidade – tem no Brasil um papel muito menor do que em outros países, como é o caso da vizinha Argentina, na construção de uma história nacional teleológica, cujas etapas pressupõem um inescapável ponto de chegada, em que se afirma a nação, com seu território, sua cultura e características próprias.
Um dos muitos méritos do livro consiste no já referido propósito de distinguir noções, de uma forma clara e, tanto quanto possível, precisa. Se a distinção entre Estado e nação não oferece grandes dificuldades, o mesmo não se dirá da caracterização de pátria e nação, noções muito próximas, que ora se aproximam, ora se afastam.
Nesse ponto, Villafañe poderia ter aprofundado a noção de pátria, a que dedica apenas algumas linhas. A distinção é importante, como se constata, exemplificando, por uma observação do autor, ao sintetizar as características do nosso Segundo Reinado, na época imperial: “Assim, o desenvolvimento de um sentimento nacional brasileiro, como apego à comunidade imaginada definida por Anderson, seria um projeto desenvolvido apenas a partir da decadência do Império. É indiscutível, no entanto, que durante o período imperial se consolidou entre grande parte da população, o sentimento do Brasil como pátria comum de todos, de norte a sul, de leste a oeste, uma noção ausente antes da Independência” (p. 94).
Entrando no exame do processo histórico brasileiro, o autor deixa de lado a linha teológica que encara episódios como a guerra contra os holandeses, ou a Inconfidência Mineira, como germes da formação da nacionalidade. Tais episódios revelariam a existência na Colônia de fortes sentimentos localistas, suficientes para gerar revoltas, mas que não tinham, entretanto, abrangência além de suas “pátrias” locais (p. 47).
Se, na visão de Villafañe, a noção de pátria na época colonial teve caráter localista, se o Império estendeu essa noção a todo o território nacional, mas sem constituir a ideia de nação, quais seriam os momentos cruciais da consolidação dessa ideia? Citando José Murilo de Carvalho, o autor enfatiza que durante a Primeira República a busca de uma identidade coletiva para o país, de uma base para a construção da nação, seria tarefa que iria preocupar a geração intelectual do período. Sem dúvida, a observação é verdadeira, mas convém notar que, na esfera da vida social e política, o sistema oligárquico republicano chocava-se com esse esforço intelectual. Muito mais do que a noção homogeneizadora de nação, o que predominou no período, no plano interno, foi o sentimento de “pátrias regionais, como a Revolução de 1932 demonstrou de forma eloquente.
Mas, ao mesmo temo, o campo da política externa, sobretudo nos primeiros anos da Primeira República, contribuiu em muito para a construção da ideia de nação. Como bem assinala Villafañe, a virada do século XIX para o século XX representou um período de grande tensão nas relações internacionais ao sul do continente americano e de seguidas intervenções estadunidenses no Caribe e na América Central.
Nesse contexto, a preocupação maior da diplomacia brasileira concentrou-se no esforço por liquidar controvérsias de fronteiras e a aquisição de um território, como foi o caso do Acre. Ao mesmo tempo, processou-se a passagem de uma estreita aproximação com a Inglaterra, não sem contradições, para uma “aliança não escrita” com os Estados Unidos, desde os primeiros tempos do regime republicano.
Nesse contexto, o barão do Rio Branco surge como a personalização dos novos tempos. Villafañe lembra que ele alcançou uma súbita e impressionante notoriedade em 1895, com o laudo que definiu a soberania brasileira na região de Palmas, no confronto com a Argentina. A esse primeiro e importante êxito, seguiu-se uma nova vitória, na definição dos limites com a Guiana Francesa, na região do Amapá. Como ministro das Relações Exteriores, de 1902 a 1912, o barão foi personagem central na compra do Acre à Bolívia; a partir de 1907, firmou tratados com a Guiana Holandesa (Suriname), com a Colômbia, o Peru e o Uruguai.
Seguindo adiante, a formação de uma identidade nacional, ao longo do século XX, tem como ponto crucial, após a Revolução de 1930, os longos quinze anos do governo Vargas e o seu chamado segundo governo, entre 1951-1954. Só nessa época, a ideia de nação se universaliza, alcançando, a rigor, todas as camadas sociais. Ponto importante, é o Estado centralizado quem promove a nação, sob várias formas, com destaque para um importante ingrediente: a política de desenvolvimento econômico e social.
Nesse ponto, o autor faz referência a várias iniciativas, bem esmiuçadas por nossa historiografia, muitas delas datando significativamente do Estado Novo, quando se deu a criação do Departamento de Imprensa (DIP), em 1939, antecedido, desde 1931, por órgãos menos abrangentes, destinados à propaganda e à difusão cultural.
Como se sabe, as atividades do DIP não se restringiram à censura dos meios de comunicação, como marca da ditadura estadonovista, mas se estenderam a muitos outros campos, paralelamente às iniciativas do Ministério da Educação e Cultura, sob a batuta do ministro Gustavo Capanema. Os objetivos governamentais consubstanciados na formação dos jovens e no incentivo à afirmação do sentimento nacional concretizaram-se nos currículos escolares, na produção de cartilhas para as escolas públicas e privadas, nos filmes de propaganda, na irradiação obrigatória da “Hora do Brasil”, nos desfiles e paradas escolares, na comemoração de datas cívicas, como a Proclamação da Independência, o Dia da Juventude, o Dia do Trabalho, o Dia da Raça, o Dia do Soldado, o Dia da Bandeira.
Além disso, o comportamento do governo Vargas, no plano da política externa, durante a Segunda Guerra Mundial, veio contribuir para reforçar o nacionalismo e a irradiação do sentimento nacional. A opção pelo alinhamento com os Estados Unidos, após a aproximação com a Alemanha nazista, desdobrou-se em episódios como o afundamento de navios na costa brasileira pelos submarinos alemães, a ruptura de relações com a Alemanha e a Itália, a declaração do estado de guerra e, por fim, o envio da Força Expedicionária Brasileira para lutar nos campos da Itália. Conviria ainda lembrar a luta pelo monopólio estatal do petróleo, no segundo governo Vargas, que transcendeu as intenções governamentais e se traduziu em mobilizações populares em todo o país, nas quais associaram-se a corrente nacionalista e os setores de esquerda, com o PCB à frente.
Depois de examinar a questão da mudança das relações entre o Brasil, os Estados Unidos e os demais países sul-americanos, a partir dos anos sessenta do século passado, Villafañe encara o futuro sob a forma de perguntas, nas quais ecoam sua visão dinâmica e a temporalidade do nacionalismo, surgindo também aí suas ressalvas com relação ao fenômeno: “Quando o mundo dos nacionalismos for superado, não será fácil entender e explicar como essa visão do mundo tão limitada pode ter sido tão importante. Que empatia despertarão as bandeiras, os hinos e os discursos sobre nações que foram inventadas e terão desaparecido com seus seguidores? Como se entenderá esse sentimento sobre linhas desenhadas em mapas? Como se explicarão os crimes e as façanhas cometidas em seu nome?” (p. 252). Poderíamos parar por aqui, com essas perguntas tão enigmáticas e tão sugestivas, assinalando a dificuldade de gerações futuras em entender o mundo em que vivemos.
Mas prefiro voltar ao título do livro porque, a partir dele, desdobra-se, num exemplo concreto, o tema já abordado das variações da ideia de nacionalidade, em função das diferenças sociais. O episódio da morte do barão do Rio Branco faz pensar e permite sugerir a exploração de novos caminhos. Sem dúvida, a repercussão da morte do barão, a 10 de fevereiro de 1912, evidenciou eloquentemente seu prestígio, sua posição entre nossos “santos” ou nossos heróis. Falam alto as manifestações desse dia, no Rio de Janeiro, quando as repartições públicas, o comércio, os escritórios das empresas, os cinemas, os centros de diversão fecharam, e mais do que tudo, o carnaval foi adiado oficialmente.
Mas é lícito duvidar que o barão do Rio Branco, figura extraordinária, ícone do Itamaraty e dos setores cultos da população, cale fundo na “alma popular”. Mesmo naquele ano de 1912, em que as autoridades adiaram o carnaval para o mês de abril, o povo brincou duas vezes, em fevereiro e em abril, apesar da atmosfera de luto. Seria excessivo dizer que a massa da população – o “povão” na linguagem de hoje – entronizou no altar da nacionalidade, em vez dos “santos” oficiais outros “santos”, nascidos de paixões como o carnaval e o futebol?
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Resenha publicada na edição de 05/03/2011 do jornal “O Globo”
O ano em que houve dois carnavais
Roberta Jansen
Morte do Barão do Rio Branco fez governo adiar a festa, mas povo brincou duas vezes
É o sonho dos foliões mais animados; uma verdadeiro pesadelo para quem é avesso aos festejos: comemorar o carnaval duas vezes por ano. Por incrível que pareça, isso já aconteceu uma vez no Brasil, em 1912, por conta da morte do Barão do Rio Branco – tido como responsável pela consolidação do território nacional e, por isso, aclamado herói. A fascinante e bem pouco conhecida passagem foi resgatada pelo historiador e diplomata Luís Cláudio Villafañe G. Santos. No recém-lançado “O Dia em que adiaram o carnaval – política externa e a construção do Brasil (Ed. Unesp), ele a utiliza como ponto de partida para discorrer sobre a construção da nacionalidade brasileira.
Não que o povo tenha ficado feliz com a morte do Barão. Longe disso. Ele realmente era muito admirado pela população. Sua morte, em 10 de fevereiro de 1912, a uma semana do início das comemorações do carnaval daquele ano, foi bastante lamentada. Como mostra Santos, em seu livro, o jornal “A República” não economizou na emotividade: “Nenhum brasileiro atingiu mais alto o culto da veneração popular. O Barão do Rio Branco era verdadeiramente um patrimônio nacional. A nação que o amou em vida, há de idolatrar-lhe reverentemente a sua memória”. A “Gazeta de Notícias” também não fez por menos, registrando, ao noticiar a morte, que “o país inteiro soluça”.
– Pela documentação que juntei, houve, de fato, uma reação muito forte da população – conta o historiador.
Como registra Santos, de forma espontânea, independentemente do luto oficial, o comércio fechou as portas, bem como os bancos e escritórios privados, além das repartições públicas. Os cinemas e os teatros não funcionaram naquele dia. E bailes e festas foram cancelados. Logo, o governo determinou que, em virtude do luto, as comemorações não começassem no dia 17 de fevereiro, conforme previsto no calendário, mas fossem transferidas para 6 de abril, em sinal de respeito.
Acre é anexado: nova vitória de Rio Branco
José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, era adorado pelo povo. Em 1902, quando retornou ao Brasil para assumir o Ministério das Relações Exteriores, ele foi aclamado nas ruas pela mesma população que, dez anos depois, chorava copiosamente sua morte.
– Ele já era um personagem bem popular quando voltou do exterior – atesta Santos.
– Uma multidão o esperava no porto, onde desembarcou, e acompanhou sua carruagem pelas ruas. Quando, num determinado ponto, os cavalos não puderam prosseguir, estudantes se ofereceram para puxá-la. Enfim, uma volta triunfante, extraordinária.
E não é para menos. O Barão, que na época ocupava o posto de Embaixador na Alemanha, tinha servido de advogado brasileiro em duas arbitragens internacionais cruciais à delimitação de nossas fronteiras: a de Palmas, em 1895, em que conseguiu assegurar para o Brasil boa parte do território dos estados de Santa Catarina e Paraná em litígio com a Argentina; e a do Amapá, em 1900, em que obteve uma vitória sobre a França na disputa da fronteira com a Guiana Francesa.
Foi justamente o prestígio obtido nesses dois casos que fez com que o então Presidente Rodrigues Alves escolhesse o Barão do Rio Branco – a quem sequer conhecia pessoalmente – para ocupar o posto máximo da diplomacia do país naquele ano de 1902, em que o governo se via às voltas com uma nova discussão sobre fronteiras, desta vez com a Bolívia, pelo então território do Acre. A despeito da oposição de nomes de grande peso da época, como os de Rui Barbosa e Pinheiro Machado, o Barão conseguiu aprovar o Tratado de Petrópolis, pelo qual o país anexava o Acre mediante pequenos territórios na fronteira com o Mato Grosso, uma indenização em dinheiro, e a ferrovia Madeira-Mamoré.
– Houve uma grande discussão no Congresso e na imprensa, e forte oposição ao tratado. Mesmo assim, ele acabou sendo aprovado, no que, até hoje, é considerada uma grande vitória do Rio Branco – afirma Santos. – Ou seja, o Barão, que já tinha retornado ao país com a popularidade em alta, obteve sucesso com a questão do Acre logo no seu primeiro ano, promovendo uma escalada de sua popularidade.
Por tudo isso, sustenta Santos, a tristeza gerada pela morte do Barão é bastante plausível.
– Os jornais todos da época registram uma grande comoção popular, com pessoas chorando nas ruas, cinemas fechados, um impacto grande – diz o historiar. – Dado o contexto, a reação me parece coerente.
Foi diante dessa situação que o governo do Marechal Hermes da Fonseca decidiu, então, adiar o Carnaval. Não funcionou. Os brasileiros acabaram festejando duas vezes. Uma, em fevereiro mesmo, a despeito do luto. Outra, de 6 a 10 de abril, seguindo as determinações governamentais. A irreverência prevaleceu, como atesta a letra da marchinha feita para o segundo Carnaval: “Com a morte do Barão/Tivemos dois carnavá/Ai que bom, ai que gostoso/Se morresse o marechá”, numa referência nada sutil à possível morte do presidente.
Carnaval remonta ao período colonial
E se a consolidação do território brasileiro, com a definição de suas fronteiras, foi crucial na construção de uma identidade nacional, como mostra Santos, o carnaval também o foi.
– O carnaval tem uma história que vem da Colônia, com o chamado entrudo, em que as pessoas jogavam água, farinha, xixi umas nas outras – conta Santos. – Com o fim do Império, ele começa a incorporar os batuques africanos; o Rei Congo, em que os negros representam suas realezas. Na virada do século XX, quando o Rio vive um período importante de modernização, começa também a importar aspectos do Carnaval europeu, do Rei Momo, do Pierrô e da Colombina. Então, esse momento da virada do século, é justamente o momento em que o carnaval começa a ganhar uma aceitação social mais ampla.
E é também na virada do século, mais precisamente em 1896, que o futebol entra no país. Junto com a noção de territorialidade, dois importantes símbolos nacionais.
– Ou seja, dois dos mais fortes simbolo nacionais são bem recentes – afirma Santos. – Símbolos da identidade que parecem eternos e muito antigos, na verdade, não o são. É o mesmo caso da extroversão e alegria do brasileiro que é bem recente.
Mas, como frisa o pesquisador, não se tratam, necessariamente, de noções construídas pelo Estado. – O Estado tem um papel importante, mas ninguém controla a construção da identidade – diz o diplomata. – Há uma circularidade das ideias. As massas, as classes subalternas trabalham as ideias. O produtos final, ninguém controla. Não há exatamente uma pessoa conduzindo o processo.
Print version ISSN 1806-9347
Rev. Bras. Hist. vol.31 no.62 São Paulo Dec. 2011
RESENHAS
Santos, Luís Cláudio Villafañe G. O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil
Tereza Maria Spyer Dulci
Doutoranda, Departamento de História, FFLCH/USP; bolsista Fapesp, Av. Prof. Dr. Lineu Prestes, 338 – Cidade Universitária. 05508-000 São Paulo – SP – Brasil, E-mail: terezaspyer@hotmail.com
São Paulo: Ed. Unesp, 2010. 278p.
O livro de Luís Cláudio Villafañe G. Santos impressiona desde o começo, pelo título, que relaciona a festa popular do carnaval à política externa, e também pela capa, uma imagem do vitral da Catedral Nacional de Washington retratando o barão do Rio Branco. Imediatamente somos levados a perceber que o livro tem como ponto de partida José Maria Paranhos da Silva Júnior, o barão do Rio Branco, responsável pela consolidação do território brasileiro, que figura naquele conjunto de vitrais, com Bolívar e San Martín, entre os heróis da América do Sul.
O autor, diplomata de carreira, mestre e doutor em História pela Universidade de Brasília, desenvolveu neste livro, O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil, publicado pela Editora Unesp, um excelente estudo sobre as relações entre nacionalismo, identidade e política externa. Partindo de Rio Branco, Villafañe percorre o panorama histórico do país, do século XIX até os dias atuais, para investigar como foi construída a ‘consciência nacional’, a ‘ideia de raça brasileira’, a ‘consciência do atraso nacional’ e a ‘liderança natural’ do Brasil na América Latina.
O adiamento das festividades populares de 1912 em razão da morte do barão do Rio Branco, ocorrida na véspera do carnaval, demonstra o prestígio e o poder do diplomata não só diante das autoridades, mas também perante a população. Este seria, para Villafañe, um caso único na história, no qual a figura de um diplomata torna-se referência para a construção da nação ao obter importantes vitórias nas disputas de fronteiras.
Embora não sejam contemporâneos, Bolívar, San Martín e Rio Branco teriam sido, cada um a seu modo, responsáveis pela consolidação das nacionalidades na América do Sul. O que salta aos olhos é que, no caso do Brasil, uma figura da República, e não do Império, foi protagonista desse processo de construção da nação brasileira. Mas como explicar o lugar ocupado por Rio Branco na memória e no imaginário da nação brasileira, quase um século depois do processo de independência?
Villafañe afirma que a independência brasileira se fez sem a presença dos famosos ‘libertadores’ dos demais países americanos, e que o Império teria criado um sentimento de pátria comum ainda atrelado à legitimidade dinástica, nos moldes dos Estados europeus do Antigo Regime, o que explica a pequena adesão da sociedade ao sentimento de identidade nacional. Isso teria mudado com a República, momento em que se buscou desenvolver um sentimento nacional brasileiro vinculado à ‘comunidade imaginada’, conceito de Benedict Anderson, do qual o autor se vale muitas vezes ao longo do livro.
Ao argumentar que a política externa é um dos aspectos mais característicos da ação do Estado na construção do nacionalismo, Villafañe destaca que a questão do território conformou o ‘interesse nacional’ brasileiro, já que é um dos elementos essenciais daquilo que o autor denomina “santíssima trindade do nacionalismo”, composta por “Estado, Povo e Território”.
Por sua vez, a identidade de um Estado, auxiliada pela política externa, se constrói muitas vezes a partir de sua relação com os demais Estados, daí a importância do conceito de ‘alteridade’, que leva o pesquisador a investigar, não apenas quais foram os ‘outros’ externos, mas também os ‘outros’ internos. Segundo Villafañe, na tentativa de criar uma ‘comunidade imaginada’ brasileira, o “outro pode assumir várias formas: brasileirosversus portugueses, brasileiros versus africanos, América versus Europa, império versus república, civilizaçãoversus barbárie, americanismo continental versus nacionalismos particulares”.
Sendo assim, o objetivo central das primeiras gerações de intelectuais da República foi reinserir o Brasil na América e superar o ‘atraso’ gerado pela colonização e pela monarquia portuguesa. O autor identifica, nesse contexto, duas vertentes de debate sobre a identidade brasileira, as quais engendraram as ideias do ‘atraso nacional’: uma baseada nas relações entre o meio e a raça (que valorizava a mestiçagem) e outra assentada numa visão antilusitana e antiafricana (que valorizava o americanismo).
O historiador afirma que, com o advento da República, transformou-se o lugar do Brasil no continente, especialmente a partir da incorporação das premissas do pan-americanismo, caras à política externa brasileira, principalmente durante a gestão de Rio Branco como chanceler, entre 1902 e 1912.
Segundo o autor, a diplomacia de Rio Branco é paradigmática para compreender a relação entre nacionalismo e territorialidade, pois buscava definir as fronteiras, aumentar o prestígio internacional do Brasil e afirmar a liderança ‘natural’ de nosso país na América do Sul, deixando como herança um ‘evangelho’ que descrevia o Brasil como “um país pacífico, com fronteiras definidas, satisfeito territorialmente”. Um exemplo interessante, analisado pelo historiador, foi a presença do Brasil nos trabalhos da Liga das Nações, participação que tinha como meta aumentar o prestígio internacional do país, mas que contribuiu, ao mesmo tempo, para a sustentação política do governo e para fortalecer as rivalidades entre Brasil e Argentina na disputa pela preponderância política e militar no Cone Sul.
Villafañe destaca ainda o Estado Novo como forte instrumentalizador da identidade nacional, já que nesse período ocorreu o processo de consolidação dos dois símbolos culturais da identidade brasileira atual: o carnaval e o futebol. Através do Departamento de Imprensa e Propaganda – órgão responsável por auxiliar as “festas populares com intuito patriótico, educativo ou de propaganda turística” – Getúlio Vargas institucionalizou o carnaval, tornando-o oficialmente símbolo da nacionalidade brasileira, e profissionalizou o futebol, com o intuito de difundir um conjunto de valores supostamente pertencentes a um caráter nacional, “produto de uma alma brasileira”.
Também a partir da Era Vargas, o nacionalismo teria se vinculado à ideia de desenvolvimento econômico e social, o que, segundo o autor, teria “acrescentado um novo elemento ao evangelho do Barão”. O desenvolvimento patrocinado pelo Estado levaria à superação do atraso e projetaria o Brasil para o futuro, ao desenvolver uma ‘autonomia da dependência’, componente ausente da política externa, tanto do Império, quanto da República Velha.
É nesse momento que, segundo Villafañe, a retórica diplomática brasileira incorpora de fato o pertencimento à América Latina, ao se perceber membro do grupo de países menos desenvolvidos e buscar a superação do ‘atraso nacional’. Dessa fase, o historiador destaca o nacional-desenvolvimentismo, característico dos governos de Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart; analisa a teoria da modernização, criada pela academia norte-americana no pós-Segunda Guerra Mundial (que contrapõe as sociedades ‘modernas’ às ‘tradicionais’) e explica por que os Estados Unidos se tornaram o ‘outro’, em contraste com a identidade latino-americana.
A partir da Política Externa Independente, do início da década de 1960, o Brasil abandonou a ‘aliança não escrita’ com os Estados Unidos, reforçou a identidade latino-americana e desenvolveu as afinidades com a África e com a Ásia, que viviam o processo da descolonização. O autor ressalta esse período, sem deixar de considerar o fato de a identidade continental americana ter sido utilizada pelos Estados Unidos como forma de controle, ao excluir Cuba do sistema interamericano em função de seu sistema político, ‘incompatível’ com os demais países da América.
Por fim, ao analisar a Ditadura Militar, o historiador realça a posição de alinhamento do Brasil com os Estados Unidos (uma volta aos velhos padrões da política externa) e enfatiza o discurso anticomunista e nacionalista dos militares (que percebem o Brasil como ‘potência regional’). Além disso, Villafañe destaca o retorno e o fortalecimento da identidade latino-americana entre o final do século XX e o princípio do século XXI, discutindo como as nações são inventadas e reatualizadas de acordo com os diferentes contextos históricos.
O autor termina o livro em tom levemente provocativo, questionando se houve ou não um rompimento com o ‘evangelho’ de Rio Branco. O grande panorama apresentado cuidadosamente por Villafañe nos permite comparar os variados períodos da nossa história, levando-nos a entender as complexas relações de poder dos diferentes projetos identitários e da ‘comunidade imaginada’ que é o Brasil. Mesmo para aqueles que discordem das premissas e das teses do autor, esta obra lúcida e instigante aponta novos caminhos de reflexão sobre a imbricada relação entre a política externa e a longa e incessante ‘construção’ do Brasil.
Resenha recebida em 8 de julho de 2011.
Aprovada em 10 de outubro de 2011.
Resenha publicada na página do indusal
GRUPO DE INVESTIGACIÓN SOBRE LAS INDEPENDENCIAS IBEROAMERICANAS DE LA UNIVERSIDAD DE SALAMANCA
http://campus.usal.es/~indusal/web/?q=node/6
En medio de las celebraciones por el Bicentenario de los procesos de independencia, todos los latinoamericanos estamos participando, consciente o inconscientemente, de un debate sobre nuestras identidades. El Dr. Villafañe G. Santos, diplomático e historiador brasileño, ha sabido captarlo y le ha servido de musa para su tercer libro: O dia em que adiaram o Carnaval (El día en que aplazaron el Carnaval).
Aborda la formación de la nacionalidad brasileña, a partir de la acción estatal, en particular, de la política exterior y toma como hilo conductor el papel que cumplió la figura de José Maria Paranhos Da Silva Júnior, en la construcción del Estado-nación; quien a su muerte habría pasado a formar parte del imaginario colectivo como uno de los “padres fundadores” del Brasil y su legado a oficiar, por años, de sustento y guía de la política de Itamaraty. Para sostener esta hipótesis, el autor, parte de dos premisas. En primer lugar que el Estado liberal construyó la nación, y la política exterior, como su expresión externa, tuvo a su cargo establecer los límites del territorio y contribuir a la creación de la identidad nacional respecto a su relación con los demás. En segundo lugar, desmitifica al nacionalismo, como fenómeno ideológico de carácter político, desde el momento en que lo considera utilizado conscientemente por los Estados, como fuente de legitimación del poder. Así Villafañe hace temblar nuestros propios cimientos, y nos invita a reflexionar sobre la acción de políticos, historiadores y artistas de todos los tiempos en la construcción de la identidad, en tanto invención colectiva, viva y en constante reelaboración, que nos lleva a cuestionar nuestro propio “yo”, y en consecuencia la idea que tenemos del “otro”.
El estudio sigue una división clásica de la historia del Brasil, donde se observa el tránsito de un sentido localista propio de unas colonias portuguesas, desunidas e indefinidas territorialmente, a un sentimiento aglutinador que hizo y hace sentirse a todos brasileños. El Imperio, legitimado por el principio dinástico‐religioso, según el autor, generó un sentimiento de patria común como sinónimo de todo el territorio e identificada con la persona del Emperador, por encima de las patrias locales. En esta etapa, fue clave la acción de la diplomacia en la demarcación del espacio nacional y en la elaboración de una imagen de país civilizado, estable, unido, poseedor de una riqueza natural inigualable y, en consecuencia, poderoso. Sin embargo, la guerra del Paraguay puso de manifiesto las debilidades del régimen que devino, en una crisis de legitimidad que terminó por causar la caída de Pedro II, y dar lugar al comienzo de una nueva era basada en valores compatibles con los sostenidos por el mundo occidental del momento.
Del libro se desprende que la construcción de la nación fue una obra de la República, y en el ámbito de la política exterior, el Barón de Rio Branco fue su principal operario. En efecto, el nuevo régimen político trajo aparejada la idea de ciudadano, en tanto, concepto homogéneo e igualitario, lo que mostró la urgencia de que todos se vieran como “brasileños”. El territorio, como base física necesaria para la construcción de la nacionalidad, fue revalorizado y asociado a la idea de grandeza e integridad. Las victorias diplomáticas del Barón en la demarcación de los límites con sus vecinos y su legado respecto a la forma en que el Brasil debía relacionarse con las otras naciones, estuvieron en la base de la creación del mito de su “paternidad”. Entonces, Paranhos, habría pasado a personificar la grandeza brasileña en el imaginario colectivo, convirtiéndose en un elemento aglutinador por encima de las diferencias sociales. Una construcción, en la que poco importa el límite entre el mito y la realidad histórica, porque tenía un fin propio e independiente: sustentar la cohesión nacional y legitimar al Estado.
Rio Branco habría sido el “santo” de Itamaraty. Construido desde el poder, para servir de guía a la hora de diseñar la imagen del Brasil, y la propia política exterior, así como para inspirar las acciones concretas de la diplomacia brasileña. El Barón le habría legado a la cancillería cuatro postulados generales (pacifismo; multilateralidad, defensa de los principios y confianza en el Derecho internacional como arma de los países débiles) que habrían de identificar al Brasil por mucho tiempo y sobre las cuales se habría erigido una nueva autoimagen: un país americano, pacifista, respetuoso, principista, dueño orgulloso de un vasto y rico territorio, sin manchas de sangre, nacido en las mesas de negociación y bautizado con champagne. La segunda mitad del siglo XX habría demandado la incorporación de nuevos elementos (por ejemplo, concebirse como un país subdesarrollado), e incluso, en los hechos, quebrar con alguna esas directivas “sagradas”.
Villafañe simplemente deja planteada la hipótesis, no entra ni en el proceso interno de la invención del mito y menos en el acogimiento por parte de los distintos sectores de la sociedad brasileña a lo largo del tiempo. Ello no le impide presentar el actual debate sobre la identidad del Brasil, en el cual se reelaborarían temas antiguos como la grandeza brasileña, y la superación del atraso, la identificación con América, Latinoamérica, o Sudamérica, con el primer mundo o del tercero, entre otros.
Este ensayo aporta innumerables líneas de investigación tanto para el caso de Brasil como para otros países. La elección del binomio construcción de la nación desde la política externa, obliga al autor a circunscribirse temporalmente al estado liberal y en consecuencia, bajo pena de desviase, lo limita para profundizar en aspectos muy importantes en ese proceso como la creación de los elementos identitarios regionales internos, su existencia paralela a la nación, incluso la exploración de lo que significó y significa ser brasileño, o de cualquier otra nacionalidad, en una sociedad heterogénea. Asimismo, incita a aventurarse en novedosos estudios, como por ejemplo, el papel de las adoraciones marianas, de manifestaciones artísticas, del deporte o de las fiestas populares como símbolos religiosos y laicos que transforman esta invención, en el fuero íntimo de cada uno de nosotros, en pasión y verdad.
O dia em que adiaram o Carnaval, ha traído a nuestra conciencia la importancia de la identidad como invención colectivamente construida, tanto para entender el pasado como para coadyuvar a elaborar el futuro, en ese sentido, el Dr. Villafañe G. Santos nos ha hecho a todos un gran favor.
Adriana Mirel Clavijo
Buenos Aires, 11 de diciembre del 2011
DEA en Historia Contemporánea por la
Universidad San Pablo CEU, Madrid.
Prof. Asistente de Historia de las Relaciones Internacionales, Facultad de Derecho, UdelaR, Uruguay.
Print version ISSN 1806-9347
Rev. Bras. Hist. vol.31 no.62 São Paulo Dec. 2011 (English version)
Santos, Luís Cláudio Villafañe G.
O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do BrasilTereza Maria Spyer Dulci (Doctoral Student, Department of History, FFLCH/USP; Fapesp Grantee. terezaspyer@hotmail.com)
São Paulo: Ed. Unesp, 2010. 278p.
Luís Cláudio Villafañe G. Santos’ book impresses from the beginning with its title, which links the popular festival of Carnival to foreign policy, and also with its cover, an image of a stained glass window in the National Cathedral of Washington portraying Baron Rio Branco. Immediately we are led to perceive that the book’s starting point is José Maria Paranhos da Silva Júnior, Baron Rio Branco, responsible for the consolidation of Brazilian territory, who appears in that set of stained glass windows with Bolívar and San Martín, among the heroes of South America.
In this book O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil, published by Editora Unesp, the author, a career diplomat, with a Master’s and Doctorate from Universidade de Brasília, has written an excellent study of the relationship between nationalism, identity and foreign policy. Starting with Rio Branco, Villafañe runs through a historic panorama of the country, from the nineteenth century to the current day, to investigate how ‘national consciousness,’ the ‘idea of the Brazilian race,’ the ‘consciousness of national backwardness’ and the ‘natural leadership’ of Brazil in Latin America were constructed.
The postponement of popular festivities in 1912 due to the death of Baron Rio Branco, which had occurred on the eve of carnival, demonstrates the prestige and the power of the diplomat not only with authorities, but also with the general population. For Villafañe this was a unique case in history, in which the figure of a diplomat became a reference for the construction of a nation by obtaining important victories in frontier disputes.
Although they were not contemporaries, Bolívar, San Martín and Rio Branco were, each in their own way, responsible for the consolidation of nationalities in South American. What is immediately obvious is that in the case of Brazil, the figure of the Republic and not the Empire was the protagonist of this process of the construction of the Brazilian nation. But how can the place occupied by Rio Branco in the memory and imagination of the Brazilian nation, almost a century after the process of independence, be explained?
Villafañe states that Brazilian independence occurred without the presence of the famous ‘liberators’ of other American countries, and that the Empire had created a feeling of a common patria still connected to dynastic legitimacy, in the molds of European Ancien Regime, which explains the low level of adhesion to the feeling of national identity. This changed with the Republic, a moment in which it was sought to develop a national Brazilian feeling connected to the ‘imagined community,’ Benedict Anderson’s concept, which the author draws on numerous times in the book.
In arguing that foreign policy is one of the most characteristic aspects of state action in the construction of nationalism, Villafañe highlights that the question of territory shapes the Brazilian ‘national interest,’ since it is one of the essential elements which the author calls the “holy trinity of nationalism,” composed of “state, people and territory.”
In turn the identity of a state, helped by its foreign policy, is often constructed through its relationship with other states, thus the importance of the concept of ‘otherness,’ which leads researchers to investigate not only what are the external ‘others,’ but also the internal ‘others,’ According to Villafañe, in the attempt to create an ‘imagined Brazilian community,’ the “other can assume various forms: Brazilians versus Portuguese, Brazilians versus Africans, America versus Europe, empire versus republic, civilization versus barbarity, continental versus particular nationalisms.”
The central objective of the first generations of intellectuals in the Republic was to reinsert Brazil in America and overcome the ‘backwardness’ caused by colonization and the Portuguese monarchy. The author identifies in this context two strands of debate about Brazilian identity which engendered the ideas of ‘national backwardness:’ one based on relations between the environment and race (which valorized racial intermixing) and another based on an anti-Portuguese and anti-African vision (which valorized Americanism).The historian states that with the advent of the Republic, the place of Brazil on the continent was transformed, especially through the incorporation of the premises of Pan-Americanism, dear to Brazilian foreign policy, notably during the time of Rio Branco as foreign minister between 1902 and 1912.
According to the author the diplomacy of Rio Branco is paradigmatic tunderstand the relationship between nationalism and territoriality, since they seek to define frontiers, increase the international prestige of Brazil and affirm the ‘natural’ leadership of Brazil in South America, leaving as an inheritance a ‘bible’ which described Brazil as a “peaceful country with defined frontiers, territorially satisfied.” An interesting example, analyzed by the historian, was the presence of Brazil in the work of the League of Nations, whose aim was to increase the international prestige of the country, but which contributed at the same time to the political sustenance of the government and to strengthening the rivalries between Brazil and Argentina in the dispute for political and military preponderance in the Southern Cone.
Villafañe also highlights the Estado Novo as a strong instrumentalizer of national identity, since in this period there occurred a process of consolidation of the cultural symbols of current Brazilian identity: carnival and football. Through the Department of Press and Propaganda – the body responsible for helping “popular festivities with a patriotic, educational, or touristic propaganda purpose” – Getúlio Vargas institutionalized carnival, making it officially a symbol of Brazilian nationality, and professionalized football with the purpose of diffusing a set of values supposedly belonging to a national character, “product of a Brazilian soul.”
Also from the Vargas Era onwards, nationalism was linked to the idea of economic and social development, which according to the author “added a new element to the Baron’s bible.” The development sponsored by the state would lead to the overcoming of the backwardness and project Brazil to the future in developing an ‘autonomy of dependency,’ a component absent from foreign policy in both in the Empire and the Old Republic.
It was at this moment when, according to Villafañe, Brazilian diplomatic rhetoric incorporated the idea of belonging to Latin America, when it perceived itself as a member of a group of less developed countries and sought to overcome the ‘national backwardness’. In this phase the historian highlights national developmentalism, characteristic of the governments of Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros and João Goulart; he analyzes the theory of modernization, created by US academia in post-Second World War era (which contrasts ‘modern’ and ‘traditional’ societies) and explains why the United States became the ‘other,’ in contrast with Latin American identity.
As a result of the Independent Foreign Policy, at the beginning of the 1960s, Brazil abandoned the ‘unwritten alliance’ with the United States, reinforced Latin-American identity and developed affinities with Africa and Asia, which were experiencing the decolonization process. The author highlights this period, though he does not forget to consider the fact that continental American identity was used by the United States as a form of control by excluding Cuba from the inter-American system in function of its political system, ‘incompatible’ with the other American countries.
Finally, in analyzing the Military Dictatorship, the historian emphasizes the position of the alignment of Brazil with the United States (a return to the former standards of foreign policy) and emphasizes the anti-communist and nationalist discourse of the military (who saw Brazil as a ‘regional power’). Moreover, Villafañe highlights the return and the strengthening of Latin American identity between the end of the twentieth century and the beginning of the twenty-first, discussing how nations are invented and updated according to different historical contexts.
The author ends the book in a slightly provocative tone, questioning whether Rio Branco’s bible has been ruptured. The great panorama carefully presented by Villafañe allows us to compare the different periods in our history, leading us to understand the complex relations of power of different identity projects and the ‘imagined community’ which is Brazil. Even for those who disagree with the author’s premises and theses of the author, this lucid and instigating work points to new paths of reflection on the inbuilt relations between foreign policy and the long and incessant ‘construction’ of Brazil.